Ultimo Fala Vila do Mês da dança

Encerrando a programação de palestras no mês da dança, Amélia Conrado.
Natural de Boa Vista (Roraima), coreógrafa, doutora e mestra em Educação(UFBA) e graduada em Educação Física (pela Universidade Federal de Pernambuco), Amélia Conrado vem dar o seu recado falando sobre DANÇAS POPULARES.

O encontro, com entrada franca, acontece amanhã, terça-feira, às 19h.

Ótima pedida para quem quer saber um pouco mais sobre as diversas tendências da dança!!!!

E para quem não pôde vir aos encontros anteriores, uma reflexão da professora Maria Cândida, que esteve por aqui participando destes diálogos com a dança:

Desconstrudança

Na década de 70, Silviano Santiago supervisionou e publicou um “Glossário de Derrida”. No verbete Desconstrução (Déconstruction), podemos ler:

Operação que consiste em denunciar num determinado texto (o da filosofia ocidental) aquilo que é valorizado e em nome de quê e, ao mesmo tempo, em desrecalcar o que foi estruturalmente dissimulado nesse texto.

A leitura desconstrutora da metafísica ocidental se apresenta como a discussão dos pressupostos, dos conceitos dessa filosofia, e portanto a denúncia de seu alicerce logo-fono-etnocêntrico. Apontar o centramento é mostrar aquilo que é “relevado” no texto da filosofia; apontar o que foi recalcado e valorizá-lo é a fase do reversement (inversão), pois estaria apenas deslocando o centro por inversão, quando a proposição radical é a anulação do centro como lugar fixo e imóvel.

O texto continua, mas só com este começo já podemos tentar sair do dilema que acompanha os dois últimos debates do Fala Vila - Mês da dança, que resumo em uma pergunta: como seria a desconstrução em dança?

A dança parece por si desconstrutora já que está fora da parte logo-fono do sistema “logo-fono-etnocêntrico”, no entanto, sua constituição como um sistema expressivo não se funda apenas em um programa etnocêntrico, pois o próprio corpo exigido pelo balé, não é o corpo étnico europeu, mas o corpo perfeito para aquela linguagem. O corpo moldado no gestual específico, como no “método Royal”, conforma então um corpo-ideal a ser alcançado, se comportando como a filosofia ocidental de viés platônico que têm como paradigma primeiro a noção de Idéia “perfeita e imutável” que deves ser buscada. Assim funcionam os modelos: conformam o ideal a ser alcançado, organizam uma “origem” que implica um lugar fixo, um centro a ser copiado e reproduzido tal qual, a perfeição está em abolir a distância da cópia e do modelo em uma “compreensão de que uma mesma técnica pode ser empregada para ensinar a dançar em qualquer canto do mundo” (Helena Katz).

O não uso do lugar fixo das técnicas corresponderia então a uma “desconstrução” em dança? Creio que ao se buscar um “modelo desconstrutor” reinstalamos um “centro”. Ciane Fernandes alertou sobre isso ao tratar em artigo: “as danças de desconstrução e fragmentação, que já viraram uma estética padrão” (2006). O mesmo fez Leda Muhana, em sua fala, alertando que mesmo um gesto improvisado, quando repetido busca um padrão, um eixo.

Como então colocar em dança o “duplo movimento” como descreve Santiago da desconstrução: a “inversão” seria o primeiro deles, que corresponde a marcar o que organizou os traços da dança até aqui, hierarquizando e colocando no centro certos valores e apagando outros, por exemplo, a perfeição do gesto repetido de uma leveza ensaiada à exaustão contra a imperfeição do improviso (também discutido no Fala Vila). Permanecer neste primeiro movimento implicaria em “operar no interior do sistema desconstruído”, mas ao afastar-se do sistema desconstruído “marca-se o afastamento”, “situando-se no campo desconstruinte”, não em favor de uma síntese mas de uma transgressão. Atenta as constantes reinscrições nos modelos antigos, que segundo Santiago são como um tecido que é preciso continuar a desfazer sempre, e conclui: “Nesse sentido, desconstruir é também descoser”. E é nestes constantes movimentos de perceber como o tecido se regenera e então descoser que se opera do desafio de produzir uma dança desconstrutora.

Salvador, 21 de abril de 2007
Maria Cândida Ferreira de Almeida

REFERÊNCIAS:

- FERNANDES, Ciane AtraveRsando Corpos: Dança e Contemporaneidade no Evento Conexão Sul 2006. http://www.revista.art.br/site-numero-06/trabalhos/9.htm#_ftnref1

- SANTIAGO, Silvio. Glossário de Derrida. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976.

- KATZ Helena. vistos de entrada e controle de passaportes da dança brasileira [Texto originalmente produzido para o livro da exposição Tudo É Brasil, realização Itaú Cultural e Paço Imperial 2004]

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