Drácula de Marcio Meirelles
A história é a mesma do romance de 1897: o excêntrico e vampiresco Conde Drácula causa terror e destruição na Londres do século XIX. Os seis personagens principais, com a ajuda do médico holândes Van Helsing, procuram exterminar a criatura. Assim como o romance, a peça decorre de forma epistolar, através de cartas e diários de bordo, o que permite ao espectador conhecer e compreender melhor os personagens. Cada ator da peça prioriza um personagem, mas não ficam presos, e permeiam por outras figuras do romance. O elenco, composto por Ciro Sales, Igor Epifânio, Lis Luciddi, Luisa Proserpio, Rafael Medrado e Will Brandão, além de Fernando Fulco como Van Helsing, dá conta do recado e a atuação é impecável.
Um fato interessante é o personagem Van Helsing. Ele não se encontra sobre o palco, aos olhos do público, mas sim ao fundo e acima dos espectadores. A questão de um dos atores se encontrar longe da visão comum do público faz com que primeiro se pense que é uma voz em off , mas depois percebe-se que os atores no palco interagem com o ator suspenso. Esta ação diferente foge ao esperado e surpreende. É comum ver pessoas na plateia olhando para trás e mostrando aos outros o ator escondido.
Drácula toma forma num palco aberto, onde há uma passarela e o público vê de perto os atores. A Sala Principal do Vila Velha permite uma infinidade de possibilidades na montagem de palco e a peça esbanja criatividade, fugindo ao padrão, muitas vezes clichê, de palco italiano.
Adaptar Drácula não é tarefa fácil e mais complicado ainda é adaptá-la de forma original, mas a peça de Meirelles usa e abusa de todos os recursos que lhe são possíveis.
A musicalidade da peça é feita, quase que completamente, ao vivo, com instrumentos dispostos pelo palco e os próprios atores os tocando, o que garante um caráter intimista, criativo e, em algumas cenas, indispensável para a compreensão do enredo. A direção musical fica por conta de João Millet Meirelles. Além da sonoridade surpreendente, há algo ainda mais impressionante: nenhum ator interpreta o Conde Drácula. A não presença de Drácula no palco só o torna mais onipresente, caracterizando-o como uma imagem projetada da monstruosidade de nós mesmos.
Apesar das singularidades já relatadas da peça, a mais fundamental e encantadora é a projeção de imagens num painel que circula o palco. As imagens estão sempre presentes e contextualizam o espectador no mundo sombrio e macabro dos personagens. Imagens da Londres do século XIX, do imperialismo britânico e seu capitalismo, de antigos Dráculas, de moscas e aranhas, de gráficos e desenhos, projetadas rapidamente ou em câmera lenta: tudo isso torna a peça uma experiência audiovisual imprescindível.
Texto: Marina Montenegro
Fotos: Tai Oliver
Assisti à peça, e até agora, a melhor resenha crítica sobre o espetáculo, foi sem dúvida essa! Texto maravilhoso! Dá até vontade de assistir de novo!
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