Romeu & Julieta por Elizabeth Ramos


Cena de "Romeu & Julieta". Foto: Diney Araujo

Assisti à nova encenação de Romeu e Julieta sob a direção de Márcio Meirelles, no Teatro Vila Velha. Mais uma vez, impressionou-me sua criatividade, pois Márcio vai além da superfície do texto, conhecido simplesmente como romântico, em torno amor impossível entre jovens. Aqui, o público é apresentado à desconstrução dessa simplicidade. A montagem confirma que Romeu e Julieta é também uma das peças mais obscenas de Shakespeare, em particular, com relação à linguagem da Ama, de Mercúcio e dos criados Gregório e Sansão, personagens irreverentes, donos de falar e gestos lascivos, que Márcio Meirelles traz ao palco com maestria.

No entanto, a linguagem lasciva não se limita a esses personagens. Mostra-se também de maneira indireta, metafórica, alusiva, repleta de eufemismos e jogos de palavras na fala de outros personagens, inclusive dos próprios protagonistas.

Ao apresentar esse aspecto ao público, Márcio Meirelles confirma que, associar a sexualidade à obscenidade vulgar significa adotar uma posição reducionista. A nova Romeu e Julieta nos apresenta o sexo de forma dramática, poética e não menos maliciosa.

Marcante é a decisão de Márcio de romper com a tradicional posição de um ator para cada personagem. Todos são Romeus, Julietas, Amas, Mercúcios... confirmando a pluralidade dos nossos papeis no mundo e rompendo com os maniqueísmos, traço tão próprio da produção de William Shakespeare. A plateia vê-se, pois, diante dos diversos jovens amantes que, contrariando todas as expectativas realizam seu amor, mas são destruídos pelas múltiplas forças hostis do destino e da sociedade.

Alguma coisa diferente do que encontramos nosso cotidiano hostil?
No mais, vale a pena assistir à peça e construir novas interpretações.

Parabéns, Márcio!

Beth Ramos*


*Elizabeth Ramos é Mestre e Doutora em Letras e Lingüística pela Universidade Federal da Bahia (1999 e 2003, respectivamente), onde é Professor Associado I, no Departamento de Letras Germânicas e no Programa de Pós-Graduação em Literatura e Cultura. Desenvolve pesquisa no campo dos Estudos Shakespearianos e da Tradução (literária e intersemiótica), dedicando-se, em particular, às relações entre literatura e cinema. Nesses campos, orienta alunos de Iniciação Científica, Mestrado e Doutorado. Em paralelo, dedica-se, esporadicamente, a pesquisas relacionadas a Graciliano Ramos. Em março de 2014, concluiu estágio de Pós-Doutorado na Univesidade de São Paulo (USP), onde desenvolveu pesquisa sobre a tradução da obscenidade na comédia shakespeariana.

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