Sergio Rivero escreve sobre a peça As Palavras de Jó
Marcio Meirelles em cena no monólogo As Palavras de Jó. Foto: Eduardo Coutinho
por Sérgio Rivero em 12/07/15
Estamos em um beco, uma quina, entre paredes que ainda suportam muitos dizeres.
Um homem, vestido como um monge, está lá atrás, sentado nos degraus de uma escada. Ele, assim como nós, ouve uma música grave.
A música, a luz dos refletores, o homem, o nosso estar ali, tudo indica que algo se inicia.
Então, o homem se levanta e vem em nossa direção.
Ele fala. Suas palavras falam de palavras ditas. As que ele possui, aquelas que são dele, aquelas que agora também são nossas.
Ele se diz morto. Morto depois de tantas torturas e uma insistência. Ele insiste em acreditar no Homem.
Seu nome é Jó, como aquele outro que acreditou em Deus, mesmo sem nada, mesmo depois de haver perdido tudo.
Este aqui acredita no Homem, o seu semelhante. E sua crença exasperada, irredutível, já é motivo suficiente para que o Homem seja crível.
Acreditar já é louvável, em tempos difíceis, neste beco, neste vinco entre paredes, nesta quina que nos sobra para ouvir o homem, que se crê, e ver suas palavras desdobrando-se e repetindo-lhe mil gratidões sem fim.
Assim é o teatro: um milhão de dizeres e o sangue e as cinzas que saem dos potes para a cabeça, a perfazer a necessária cena, assim como um espasmo que irrompe constrito num longo “ai” de mãos crispadas, com a música grave que nos levará direto para onde o homem parece sucumbir. Acreditar.
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