CRÍTICA DE BAKULO PUBLICADA EM O GLOBO
Panfletagem no palco não ajuda espetáculo
Barbara Heliodora
A Companhia dos Comuns está encenando, no Teatro Nelson Rodrigues (Caixa Econômica), "Bakulo", seu terceiro espetáculo. Depois do belo e emocionante "Candaces, a reconstrução do fogo", o grupo, sempre voltado para a pesquisa das raízes africanas do negro brasileiro, optou por voltar para o tom didático/ideológico de sua primeira montagem, "A roda do mundo", com um texto de Marcio Meirelles, com a colaboração de Gustavo Melo, Felipe Kouri e do próprio elenco.
O didatismo, desta vez, é declarado ao ponto de o espetáculo ser composto pela apresentação da leitura de uma série de panfletos, seguida de episódios que seriam ilustrativos da influência dos "ancestrais" (significado exato da palavra "bakulo"). O tom é o da virtual sacralização da África e sua herança, em aguerrida contraposição à herança portuguesa no Brasil, sempre com o objetivo de mostrar que, embora mais tardia, a colonização africana é mais forte e superior à que a antecedeu. A condenação da atual cultura ocidental é radical, a dramaturgia tem a obviedade e o primarismo propositado do antigo engajamento, com orientação política que tem muito de saudosista, sendo que até mesmo a aquisição de um doutoramento em universidade é vista como uma traição à cultura dos antepassados.
Cenografia simples e luz bonita e funcional
A cenografia, de Marcio Meirelles, é simples, basicamente composta por elementos retangulares de madeira que servem como banco, como pedestal, ou o que quiserem, e os figurinos de Biza Vianna são todos brancos, bustos nus, calças/saias brancas com largos panejamentos igualmente brancos na frente e nas costas, que permitem belas composições. Paletós brancos indicam ocidentalização. A luz de Jorginho de Carvalho é bonita e funcional, e a direção musical de Jarbas Bittencourt (como a preparação vocal de Agnes Moço e Carolina Futuro) fazem uma notável contribuição ao espetáculo. A coreografia de Zebrinha, a preparação corporal de Denis Gonçalves e a preparação de dança afro de Valéria Mona são todas de alta qualidade.
A direção de Marcio Meirelles tem como principal objetivo ressaltar o aspecto didático de "Bakulo", muito marcado no tom da leitura dos vários panfletos, bem como nos pequenos diálogos dos episódios ilustrativos, sempre preocupados em estimular preconceitos e ressentimentos, mesmo que por vezes só de modo implícito.
Elenco homogêneo usa tom professoral
O elenco, homogêneo em seu comprometimento com os objetivos de texto e direção, com as falas praticamente todas usando o mesmo tom professoral, e sempre executando com eficiência e harmomonia todo o enriquecimento corporal do espetáculo, é composto por: Cridemar Aquino, Débora Almeida, Fábio Negret, Gustavo Melo, Hilton Cobra, Rodrigo dos Santos, Tatiana Tibúrcio, Valéria Mona e Vânia Massari. Os músicos são Alanzinho Rocha, Filipe Juliano, Frida Maurine, Glaucia Brum e Rocino. "Bakulo" não alcança nem a beleza e nem a emoção de "Candace", mas é menos confuso do que "Roda de fogo".
Rio, 16 de setembro de 2005
Panfletagem no palco não ajuda espetáculo
Barbara Heliodora
A Companhia dos Comuns está encenando, no Teatro Nelson Rodrigues (Caixa Econômica), "Bakulo", seu terceiro espetáculo. Depois do belo e emocionante "Candaces, a reconstrução do fogo", o grupo, sempre voltado para a pesquisa das raízes africanas do negro brasileiro, optou por voltar para o tom didático/ideológico de sua primeira montagem, "A roda do mundo", com um texto de Marcio Meirelles, com a colaboração de Gustavo Melo, Felipe Kouri e do próprio elenco.
O didatismo, desta vez, é declarado ao ponto de o espetáculo ser composto pela apresentação da leitura de uma série de panfletos, seguida de episódios que seriam ilustrativos da influência dos "ancestrais" (significado exato da palavra "bakulo"). O tom é o da virtual sacralização da África e sua herança, em aguerrida contraposição à herança portuguesa no Brasil, sempre com o objetivo de mostrar que, embora mais tardia, a colonização africana é mais forte e superior à que a antecedeu. A condenação da atual cultura ocidental é radical, a dramaturgia tem a obviedade e o primarismo propositado do antigo engajamento, com orientação política que tem muito de saudosista, sendo que até mesmo a aquisição de um doutoramento em universidade é vista como uma traição à cultura dos antepassados.
Cenografia simples e luz bonita e funcional
A cenografia, de Marcio Meirelles, é simples, basicamente composta por elementos retangulares de madeira que servem como banco, como pedestal, ou o que quiserem, e os figurinos de Biza Vianna são todos brancos, bustos nus, calças/saias brancas com largos panejamentos igualmente brancos na frente e nas costas, que permitem belas composições. Paletós brancos indicam ocidentalização. A luz de Jorginho de Carvalho é bonita e funcional, e a direção musical de Jarbas Bittencourt (como a preparação vocal de Agnes Moço e Carolina Futuro) fazem uma notável contribuição ao espetáculo. A coreografia de Zebrinha, a preparação corporal de Denis Gonçalves e a preparação de dança afro de Valéria Mona são todas de alta qualidade.
A direção de Marcio Meirelles tem como principal objetivo ressaltar o aspecto didático de "Bakulo", muito marcado no tom da leitura dos vários panfletos, bem como nos pequenos diálogos dos episódios ilustrativos, sempre preocupados em estimular preconceitos e ressentimentos, mesmo que por vezes só de modo implícito.
Elenco homogêneo usa tom professoral
O elenco, homogêneo em seu comprometimento com os objetivos de texto e direção, com as falas praticamente todas usando o mesmo tom professoral, e sempre executando com eficiência e harmomonia todo o enriquecimento corporal do espetáculo, é composto por: Cridemar Aquino, Débora Almeida, Fábio Negret, Gustavo Melo, Hilton Cobra, Rodrigo dos Santos, Tatiana Tibúrcio, Valéria Mona e Vânia Massari. Os músicos são Alanzinho Rocha, Filipe Juliano, Frida Maurine, Glaucia Brum e Rocino. "Bakulo" não alcança nem a beleza e nem a emoção de "Candace", mas é menos confuso do que "Roda de fogo".
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