Fino Trato
Que coisas estranhas beirando o sobrenatural acontecem no Teatro Vila Velha, isso todo mundo sabe. Que criam-se expectativas das mais esdrúxulas sobre o que pode ser encontrado aqui dentro também já é do conhecimento de todos. Uma vez ligaram para cá perguntando por mágico, palhaço, macaco, anão... tudo isso em uma só ligação. Esses acontecimentos geralmente mais divertem do que incomodam. Quando uma senhora ligou perguntando se algum técnico poderia dar um pulinho no auditório do Colégio 2 de Julho pra resolver um problema com a cortina, foi constrangedor, mas pelo menos foi engraçado. Há, no entanto, uma série de acontecimentos, que podem ser classificados como equivocados, esdrúxulos ou mesmo surreais que incomodam bastante.
Não raro, aparece alguém pelas redondezas do Teatro perguntando para qualquer um: "Ô menino, Marcio Meirelles tá aí?". A resposta geralmente é "Não sei". Dificilmente sabe-se, mesmo. Saber se Marcio está é tarefa complicada para qualquer um. A pergunta em si, não se pode condenar, condenável é o tom, e a reação ao "não sei". As pessoas reagem como se fosse um absurdo não sabermos onde está Marcio Meirelles, Chica Carelli, Zebrinha, Sônia Robatto, Othon Bastos ou quem quer que se esteja procurando. A reação é como se estivéssemos enrolando, ou dando uma resposta padrão. Aí vem: "Eu sou fulano de tal de não sei aonde, Marcio é muito meu amigo, trabalhamos juntos em tal, tal e tal produções, eu tenho certeza que se você disser que sou EU, ele vai me atender". Chega-se nessa parte do diálogo geralmente antes de dar tempo de saber se Marcio ou quem quer que seja, está, esteve, ou estará no teatro. As vezes é melhor ainda! As vezes o ilustre desconhecido (desconhecido para mim, pelo menos, que nasci em 83...) solta pérolas como: "Mas eu que construí isso aqui. O Vila Velha é o que é hoje por minha causa" e por aí vai. Recentemente até "você sabe quem eu sou?" teve.
Dia desses ligaram, eram três da tarde, mais ou menos, fui eu que atendi: "Alô, João Sanches está?" Olha, eu não sei, não tive notícia dele hoje aqui ainda, quem quer falar?... "mas ele não tá com uma peça aí?", está, está sim, "chame ele aí", aguarde um momento que eu vou ver se ele está. Nas duas portarias, ninguém tinha visto João entrar ou sair no tal dia. Alô?, pois, João não está "mas ele não é daí?", mais ou menos, não sei, ele é diretor de um espetáculo que está em cartaz, mas não é funcionário da casa... "tá, tá, deixe". E desligou.
Parece excepcional tanto imediatismo e tão pouca educação, mas não é tão fora do comum quanto minha mãe me ensinou que seria. Esse personagem, a "grande figura" que chega sem avisar, sem marcar e quer ser atendido por pessoas que as vezes sequer trabalham aqui - atendi uma vez alguém que queria urgentemente falar com Biza Vianna - simplesmente porque querem. Ou porque são sicrano de não sei aonde, pessoa muito importante para a história deste teatro, e não precisariam nem se identificar.
Voltando à realidade eu fico aqui pensando: se nem o estagiário pode, a qualquer hora, largar o que estiver fazendo para atender quem quer que seja, que apareça sem avisar, porque alguém mais poderia? E muito mais grave: Porque as mais de duzentas pessoas que trabalham com o Vila diretamente saberiam quem são essas sub-celebridades-importantíssimas para a história do Vila? Pois saibam que isso é frequente, e que as tais pessoas ainda por cima ficam ofendidíssimas. Quer dizer...
Camilo Fróes
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