Por Lula Oliveira
Estava eu saindo de casa para levar minha filha na escola. Era umas 5h50 da manhã. Os pensamentos já iniciam o dia imersos em preocupações cotidianas existencialistas. Angústias que nos acompanham dia a dia. Desço as escadas do prédio. Ao chegar na garagem, me deparo com um passarinho morto. Paraliso diante da cena. Penso nos problemas vivos diante da fragilidade da vida que se concretiza no seu apagamento existencial. O passarinho morreu voando. Vivendo em seu maior esplendor. Flutuando no vento. Sem perceber, deve ter batido contra uma janela. Impactado pelo horizonte espelhado numa concretude em profundidade que espelha um horizonte tangível. O espelho reflete uma paisagem que existe para trás. Não há horizonte. Há uma imagem que o engana. Um falso horizonte. Parei em frente ao corpo do bichinho e me perguntei: E agora? O que faço?Alguns minutos paralisado diante do corpo estático, frágil e belo. Um corpo perfeito, sem vida. Só pensava nele voando. Peguei uma folha seca da amendoeira e coloquei o passarinho na mesma posição que o encontrei estatelado no cimento frio e molhado da garagem. Coloquei embaixo de uma planta e o cobri com outra folha seca de amendoeira. Ritualizei a morte do passarinho dando ao bichinho um rito de transcendência espiritual. Lamentei seu desaparecimento do planeta. E rezei pela sua alma/energia. Segui adiante pensando na brevidade da vida e pensando em ficar mais atento com as armadilhas do falso horizonte. Pedi licença e fotografei a morte para celebrar a vida. Em tempo, foi o dia do falecimento de Harildo Deda, da notícia do cancelamento do festival de jazz do Capão, do adiamento do Panorama Coisa de Cinema, do dia Nacional do Teatro. Celebremos a arte. Voa passarinho!
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