“Traga-me a cabeça de Lima Barreto” chega a Salvador
A peça, sucesso de público e de crítica, tem apoios artísticos de peso. Monólogo teatral celebra a genialidade e a obra do grande escritor brasileiro.
Inspirada livremente na obra de Lima Barreto
(13/5/1881 * 1/11/22), especialmente em Diário Íntimo e Cemitério dos
vivos, “Traga-me a cabeça de Lima Barreto” é
um monólogo teatral, com interpretação de Hilton Cobra e direção de Fernanda
Júlia (do Grupo NATA de Teatro, da Bahia) que reúne trechos de memórias
impressas em suas obras, entrecruzadas com livre imaginação. O texto fictício tem
início logo após a morte de Lima Barreto, quando eugenistas exigem a exumação
do seu cadáver para uma autópsia a fim de esclarecer “como um cérebro inferior
poderia ter produzido tantas obras literárias - romances, crônicas, contos,
ensaios e outros alfarrábios - se o privilégio da arte nobre e da boa escrita é
das raças superiores?”. A partir desse embate com os eugenistas, a peça mostra
as várias facetas da personalidade e da genialidade de Lima Barreto, sua vida,
família, a loucura, o alcoolismo, sua convivência com a pobreza, sua obra não
reconhecida, racismo, suas lembranças e tristezas.
A narrativa
ganha força com trechos dos filmes “Homo Sapiens 1900” e “Arquitetura da
Destruição” – ambos cedidos gentilmente pelo cineasta sueco Peter Cohen. O
cenário, de Marcio Meirelles – um verdadeiro manifesto de palavras – contribui
para a força cênica juntamente com o figurino de Biza Vianna, a luz de Jorginho
de Carvalho, a direção de movimento de Zebrinha e a música de Jarbas
Bittencourt. Os atores Lázaro Ramos, Frank Menezes, Harildo Deda, Hebe Alves, Rui Manthur e
Stephane Bourgade – todos amigos e admiradores do trabalho de Cobra,
emprestam suas vozes para a leitura em off de textos de apoio à cena.
Trazer Lima Barreto para o primeiro
plano desse debate, encontrar um equilíbrio entre as reflexões sobre a eugenia
e a vida e obra do escritor foi, para Luiz Marfuz – responsável pela
dramaturgia da peça, um desafio: “Obviamente
estamos tratando de uma situação imaginária, um Lima idealizado. Ele sempre se
colocou como um escritor militante; e isso é nitidamente visível não só nos
romances, mas nas inúmeras crônicas em que defendeu suas ideias humanistas, com
fortes doses de anarquismo e socialismo, posicionando-se contra a política, os
governantes, o sistema econômico, as injustiças sociais. Mas a questão da
eugenia não foi tratada por ele de forma direta e aberta. Então a arte cria um
espaço para que Lima, após uma vida marcada pelo alcoolismo, loucura, a
indigência cotidiana e a discriminação racial, retorne com a consciência dessas
questões para defender suas ideias”, explica Marfuz.
Responsável
pela direção do espetáculo Fernanda Julia, que é diretora do NATA de
Alagoinhas, conta como o trabalho que vem realizando no grupo teatral contribuiu
no processo de direção de Traga-me a
cabeça de Lima Barreto: “O diálogo crítico e politizado sobre negritude é
um disparador potente do fazer cênico do NATA. Esses elementos foram
fundamentais para que eu percebesse quais caminhos trilhar na construção do
espetáculo. Sou uma provocadora e problematizadora por natureza, e acho que a
encenação deve seguir este caminho – provocar a reflexão e problematizar o que
está posto. São dois caminhos que sigo e que fundamentam minhas escolhas
poéticas e estéticas. Sou uma encenadora negra e afirmativa, desejo sempre
colocar em cena a beleza, a grandiosidade e as vitórias do meu povo.”
Hilton
Cobra, que criou a Cia dos Comuns em 2001 com o propósito de trazer à cena uma
cosmovisão artisticamente negra especialmente no âmbito das artes cênicas, fala
da motivação para encenar Traga-me a
cabeça de Lima Barreto: “É
muita responsabilidade discutir eugenia e racismo a partir de Lima Barreto.
Também é um reconhecimento à Lima – um autor tão pisoteado, tão injustiçado,
que pensou tão bem esse Brasil, abriu na literatura brasileira “a sua pátria
estética”, os pisoteados, loucos, os privados de liberdade – esses são os
personagens de Lima Barreto. Acredito que ele deve ter sido, se não o primeiro,
um dos primeiros autores brasileiros que colocaram esse “submundo” em qualidade
e com importância dentro de uma obra literária”.
Traga-me
a cabeça de Lima Barreto
cumpriu sua primeira temporada no Sesc Copacabana (RJ) no período de 14 de
abril a 7 de maio, com grande sucesso de público e crítica. Recentemente, o espetáculo
teve apresentação, com ingressos esgotados, na Flip – Festa Literária
Internacional de Paraty. Gilberto Bartholo, crítico teatral, assim descreveu o
espetáculo:
“...O
texto é genial, mesclando ineditismo com frases de eugenistas e do próprio LIMA
BARRETO. Tudo o que é dito se encadeia muito bem e se apresenta de uma forma
meio didática, porém não enfadonha; muito ao contrário, é dinâmico, valorizado
pela magnífica e irrepreensível atuação de HÍLTON COBRA, um ator de grandes
possibilidades técnicas, que, parecendo imantado, atrai os espectadores, desde
sua entrada triunfal em cena, e mantém essa atração até o apagar do último
refletor. Dono de um carisma, de um talento e de uma gigantesca presença de
palco, HÍLTON nos brinda com uma atuação inesquecível, um convite a voltar
àquele espaço, para aplaudi-lo mais e mais...”
Ficha
Técnica:
Hilton
Cobra – Ator | Luiz
Marfuz – Dramaturgia | Fernanda Júlia – Direção | Cenário: Vila
de Taipa (Laboratório de Investigação de Espaços do Teatro Vila Velha), Erick
Saboya, Igor Liberato e Márcio Meireles | Desenho de Luz: Jorginho de
Carvalho e Valmyr Ferreira | Figurino: Biza Vianna | Direção de
Movimentos: Zebrinha | Direção Musical: Jarbas Bittencourt |Direção de vídeo: David Aynnan | Direção de Produção: Tania Rocha | Produção
executiva: Afonnso Drumond | Design
gráfico: Bob Siqueira e Gá.
Participações especiais (voz em off): Lázaro Ramos, Frank
Menezes, Harildo Deda, Hebe Alves, Rui Manthur e Stephane Bourgade
Serviço:
Local:
Teatro Vila Velha
Estreia:
30/NOV / 2017
Temporada:
01 a 10 DEZ / 2017 - QUI a DOM
Horário: QUI a SAB - 20h00 -
DOM – 19h00
Ingressos:
QUI – R$ 20,00 | R$ 10,00 - SEX a DOM – R$ 30,00 | R$ 15,00
Comprar em www.teatrovilavelha.com.br ou na
bilheteria do teatro.
Comentários
Postar um comentário